26 de fevereiro de 2010

Recomeço

Havia muito a ser escrito.
As moças bonitas, os sorrisos sinceros, as lembranças as noites de festa, os dias ensolarados, os pés descalços, os banhos de chuva no quintal...
"Vai passar, tu sabes que vai passar..." sussurrava Caio F., e eu me agarrava a cada centímetro desta certeza na tentativa desesperada de recuperar o ânimo, a paz, o fôlego.
E falar era o fôlego.
Era necessário escrever sobre o que ainda doía afim de extirpar qualquer resquício de vazio e incerteza que insistisse em permanecer aqui dentro.
E partindo deste princípio fui me reerguendo. Dia após dia, palavra após palavra. Percorrendo novamente este caminho tanta vezes já trilhado.
E havia muito a ser escrito.
Os sonhos, as flores secas nas páginas dos livros, as conversas amistosas, as saudades, as histórias esquecidas...
Abri as gavetas, recuperei os cadernos, recuperei o fôlego.

19 de fevereiro de 2010

...ao fim.

"Na primeira manhã que te perdi, acordei mais cansado que sozinho..."
(Alceu Valença)

O que você não entende é que ao partir levarás contigo Chico, Vinícius, Neruda e toda a poesia. Porque quando você for embora, eu até tentarei reler os versos, mas doerá tanto, que eu desistirei.

O que você não entende é que eu dormirei todos os dias abraçada a um urso barrigudo, e vou cheirá-lo ainda que nele não haja mais seu cheiro, na doce esperança de encontrar algum resquício do seu perfume ali.

O que você não entende é que agora, todas as vezes em que eu entrar no meu carro, vou olhar para o banco ao lado e não mais te verei. Não vou mais ter seu colo para deitar, não vou ter com quem compartilhar minhas histórias nem planejar o meu futuro.

O que você não entende é que a fumaça do cigarro terá tons de solidão e eu não mais escreverei declarações de amor nas mesas dos bares. E até a cerveja gelada perderá seu sabor já que não terei com quem brindar, com quem conversar, com quem rir ao tomá-la.

O que você não entende é que meu ombro esquerdo carrega uma cicatriz rosada que por descuido você provocou e toda vez que eu olhar para ela, sofrerei sabendo que por dentro uma cicatriz mil vezes maior estará se abrindo.

O que você não entende é que eu terei de jogar um por um dos nossos planos ao vento. O casamento, a casa bonita, as viagens para lugares com lindas cachoeiras, nossa filha... Valentina, Valentina, Valentina.

O que você não entende é que meu corpo sentirá muito a falta do seu. Sua pele, sua boca, seu calor, suas mãos, nossas palavras... E só me restará a falta. A falta e o silêncio.

O que você não entende é que junto contigo irão embora os elogios. Meus perfumes nunca mais me tornarão "a mulher mais cheirosa do mundo" e eu vou passar a mão em meus cabelos detestando todas essas ondas, esquecendo quantas vezes você disse que ele era lindo.

O que você não entende é que você assistirá mil filmes e nunca mais me ligará para dizer: "Amor, certeza que você vai chorar com este." E quando eu assistir a qualquer filme e chorar muito, não haverá ninguém para me abraçar e dizer: "Minha chorona."

O que você não entende é que eu te chamava de minha vida e era verdade. E agora que eu te vejo indo embora sinto uma parcela quase que inteira minha partindo com você.

O que você não entende é que hoje, depois da nossa conversa, eu fui caminhando pela chuva com vontade de ser levada por ela. E ao entrar no carro, ensopada de chuva e lágrimas, eu tive vontade de gritar um "Não" bem alto, incrédulo, por tudo o que está acontecendo. E saí dirigindo sem saber para onde.

O que você não entende é que essa dor que eu estou sentindo nunca passará. Daqui há algum tempo eu vou parar de chorar compulsivamente, vou manter o controle, me acalmar, mas a dor continuará aqui, estática, solitária, tal e qual agora.

E o que você nunca, jamais entenderá, é que minha história ganhará reticências e não um final feliz. Foi embora da minha vida meu ponto final.

(As coisas que você não entende)

Do início...

A princípio a contemplação
Correr os olhos por entre imagens, render-se àquela face, deixar-se encantar, plenamente, ainda que desconhecendo qualquer parágrafo de sua história, apenas deixar-se encantar
Nadar num mar de dúvidas, mergulhar no não saber
Não saber quais paixões habitavam aquele coração
Será que é feliz? Será que sofre?
Não ela não poderia sofrer. Ela é feita de Lua e sonhos, emana suavidade, deve andar entre nuvens e poesias, pode até carregar consigo um quê de tristeza, mas uma menina tão linda não poderia sofrer
Em seguida, o encontro
A sensação de banhar-se em chuva e sentir o vento gelado percorrer o corpo, o coração, a espinha, mesclando intensidade e lentidão
Vê-la, hipnotizar-se
Pasmar-se diante daquela mulher
Os olhos, o misto perfeito entre a doçura e a sensualidade
Os lábios coroados com o sorriso tímido
A voz soando como acordes de um violão
O corpo, escultura sinuosa guardada pelo dragão
Os cabelos, cascatas negra por onde meus dedos gostariam de deslizar
E a covinha, ah, a covinha
A maneira mais sublime que Deus encontrou para colocar um ponto final em toda aquela perfeição
Era ela, eu tive então certeza. Era ela a quem eu devotaria os sentimentos mais puros e as sensações mais intensas
Era ela quem ali fez com que eu me rendesse, quebrasse toda e qualquer barreira que eu tivesse construído afim de proteger meu coração
Era por ela quem eu esperava naquelas madrugadas tristes em que chorava sozinha por entre meus lençóis, era com ela que eu sonhava todas as noites, era por ela que eu planejava, era ela quem eu sempre quis
E eu me desarmei, me perdi completamente por entre seus olhos, seus lábios, sorriso,voz, corpo, cabelos...
E a covinha, ah, a covinha
A maneira mais sublime que Deus encontrou para me dizer que ela seria meu ponto final.